quinta-feira, 20 de abril de 2017

Combater a castração química: gravidez depois do cancro



Pedi aos vários oncologistas que me atenderam para não me colocarem em menopausa. Nenhum se preocupou com isso. Alguns entravam no consultório a dizer: «Então já está na menopausa não é?». Porque assumiriam que uma mulher de 50 anos estaria na menopausa quando esta pode acontecer tão tarde quanto os 56 ou 58? Levavam logo com um «Não, não estou, aliás a minha ginecologista diz que tenho uma excelente fertilidade para a minha idade». Sabendo que não tinha filhos, porque não me propuseram formas de preservar a fertilidade e de evitar uma menopausa súbita? Pura discriminação etária.

Com a quimioterapia uma mulher pré-menopausica perde a capacidade de gerar filhos. Os ovócitos são fortemente afectados, a reserva ovárica diminui. Sem ovócitos saudáveis, a menstruação desaparece, geralmente para sempre, se bem que haja excepções. Quanto mais perto a mulher está da sua idade de menopausa, mais probabilidades tem de entrar neste período da vida. E entra subitamente, sem o benefício de uma adaptação ao longo de vários anos.

Durante a quimioterapia comecei a ter dores no ovário direito. A meio do tratamento tive o último período. Até hoje, sete meses depois, não voltou. Recentemente comecei a ganhar peso sem motivo, a perder massa muscular, a ter gordura abdominal, pele seca e sobretudo muitas, muitas dores articulares.
O que fazer para preservar a fertilidade e juventude que a quimio nos tira? Não há nada a fazer a quimio representa a estirilização e a entrada na terceira idade que amenopausa implica. No entanto pode-se tentar preservar a capacidade de ter filhos, que é possível mesmo na menopausa.

1. Supressão ovárica. Envolve a toma de hormonas (os chamados agonistas de GnHR ou gonadotropin releasing agonists) que suprimem a função ovárica, induzindo a menopausa e protegendo assim os óvulos. O medicamento é o goserelin,  nome farmacêutico Zoladex (também se usa o leuprolide, o Lupron) e deve ser injectado uma vez por mês ao longo da quimioterapia. Embora os estudos mostrem que nem sempre este tratamento é efectivo, vale sempre a pena tentar (apesar de as hipóteses de funcionar serem maiores nas mulheres mais novas, estou arrependida de não o ter feito -  a única oncologista que referiu estas injecções por alto, disse-me que não valia a pena porque os resultados não eram cem por centro garantidos). Estas hormonas não devem ser tomadas mais de seis meses porque ao fim desse tempo os ossos começam a enfraquecer.

2- Recolha de óvocitos. Deve ser feita antes da quimioterapia por aquelas que mais tarde queiram engravidar. A recolha envolve uma estimulação hormonal prévia o que pode fazer crescer o tumor quando este é reactivo ao estrogénio e/ou à progesterona.

3- Crio-preservação embrionária. Se houver dador de esperma pode ser feita a fertilização in vitro dos ovócitos recolhidos e os embriões podem ser congelados para futura implantação.

3- Recolha de tecido ovárico. É crio-preservado antes da quimio e mais tarde é implantado para estimular a função ovárica permitindo reverter a menopausa. Sim, leram bem reverter a menopausa (o que eu mais queria neste momento). Mas é sobretudo útil para mulheres mais novas, que ainda tenham muitos óvulos. 



Encontrei bastantes artigos científicos (por ex. este, este e este) sobre a necessidade de preservação da fertilidade das pacientes de cancro que sublinham, logo no seu resumo, que estas não são informadas sobre a questão pelos médicos, embora nalguns países estes até sejam obrigados a fazê-lo por lei (não sei qual o caso em Portugal: a mim não me informaram).
Quanto à gravidez após a quimioterapia parece ser segura para as sobreviventes, segundo uma grande quantidade de estudos e sites especializados. A taxa de recorrência não é alterada pela gravidez. Porém aquelas que têm cancro da mama hormonal têm de considerar a percentagem de risco, pesando toda a informação sobre o seu caso (tipo de cancro, o Ki67, com ou sem gânglios afectados, margens deixadas após retirar tumor etc., toda a  informação que encontram nos posts sobre Diagnóstico).
Porém, se a gravidez não parece alterar a sobrevida, também é certo que muitas mulheres que têm o primeiro filho tardiamente, são sérias candidatas ao cancro da mama. Conheço pessoalmente alguns casos.
Na minha opinião as pacientes de cancro da mama têm de equacionar a relação entre a quimioterapia e a perda de fertilidade/menopausa antecipada e decidir se esse tratamento é realmente necessário no seu caso concreto. Ensaios clínicos como o Mindact (2016), que já aqui referi, concluíram que há um abuso da administração da quimioterapia às pacientes de cancro da mama. Peçam ao médico um teste clínico como o Adjuvant! ou um teste genómico como o MamaPrint. Expliquem que querem preservar a vossa fertilidade ou simplesmente que não querem entrar em menopausa forçada. Mesmo que tenham 50 anos!
Uma amiga descobriu que estava grávida ao mesmo tempo que teve uma recidiva do cancro da mama. Muitas mulheres tratam o cancro da mama durante a gravidez, inclusive com quimioterapia, como essa amiga.
No entanto, continuam a praticar-se horrores: há médicos que fazem um aborto na mesma operação em que fazem a mastectomia, antes de iniciarem a quimioterapia que vai impedir essa mulhere de ter filhos. Vejam, neste fórum, o caso desta mulher de 30 e poucos anos grávida de dez semanas quando soube que tinha cancro. Foi-me relatado por um amigo um outro caso: um médico tentou obrigar a filha grávida de três meses e meio a abortar quando esta descobriu que tinha cancro. Ela recusou-se. Mais tarde foi sujeita a uma mastectomia e hoje ambos estão de saúde, mãe e bébé.
Dar vida quando a morte nos ameaça é uma bênção e algo que não nos devia ser negado.

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